Sentada no sofá, Teresa observava Laura e Mariana estranhamente se divertindo enquanto Mariana era trocada de roupas como se fosse uma boneca de porcelana. Por vezes Teresa ria, mas logo se perdia nos problemas que tomava sua vida. Por um instante ela imaginou Ricardo ali sentado ao lado dela... Mas era uma lembrança muito distante que logo se evaporava de sua mente... Outras mais imediatas tomavam conta de seus pensamentos. O que Ricardo fazia em Taquarana? Por que ele tinha que morrer? Por que ele tinha que deixar uma família tão cheia de ambição para trás? Não que ambição seja um problema, mas desde que seja limitada. Porque Clarice pode ter filhos? Porque ela não pode ter filhos? Porque ela encontrou Mariana justo agora?
-Papai do Céu! Teresa olhava espantada para Mariana, que estava com os bracinhos cruzados sobre a perna de Teresa, a menina falava com certa naturalidade o nome de Deus, meio que séria.
-O quê?!
Teresa olhava para Mariana e em seguida para Laura sem conseguir entender nada. Laura por sua vez também estava meio espantada e aproveitava para responder a pergunta que estava descrita na cara de Teresa.
-A senhora estava falando em voz alta... -Tava perguntando por que encontrou ela? -Porque encontrou a Mariana, justo agora?
Teresa olhava sorrindo para Mariana e a pegava no colo...
-Você acha que foi Deus que fez eu te encontrar meu anjo? Mariana torcia os lábios, enquanto Teresa não conseguia controlar o choro, abraçando a menina, que parecia cada vez mais tomar conta de seu coração. Teresa olhava para Laura por cima dos ombros de Mariana sorrindo como se agradecesse a ela com um olhar. Laura devolvia um sorriso meio de canto... Afastando Mariana e ficando de frente com ela, Teresa fazia a pergunta mais querida de todas.
-Quem está com fome? Mariana abria um largo sorriso e desinibida erguia os dois braços enquanto falava com sua voz mansa que Sim... Laura de braços cruzados ria daquilo espontaneamente balançando a cabeça negativamente.
...
Já eram mais de Oito horas da noite, Laura terminava de cobrir Mariana na cama após ela dormir no colo de Teresa... Laura olhava para a menina como se a pobrezinha tramasse algo ou tentava enxergar em Mariana uma resposta qualquer para suas duvidas. Para Laura a menina praticamente estava aplicando um golpe em Teresa. Laura balançava a cabeça achando que estava indo longe demais com estas suspeitas idiotas. Ela saia do quarto e então ouvia Teresa no telefone... Laura ficava parada no escuro ouvindo a conversa da patroa.
-Exatamente Cézar... Eu encontrei a pobrezinha na rua! -...! -A menina tava toda suja, coitada... Você tinha que ver o que fizeram com ela, eu não podia deixar a menina mergulhada na urina dos outros como se não me importasse. -...! -...! -Mariana, ela disse que se chama Mariana! -Ah, Cezar, ela é um doce de menina... Um anjo! -Eu não sei como alguém pode permitir que ela viva desse... -...! -Sim, eu to revoltada com a situação e não poderia ser diferente... -Como pode uma avó fazer isto com a própria neta? -...! -Eu sei, eu sei! -Eu sei disso Cézar! -...! -Eu não sei, porque ainda não estive com essa mulher... Com a vó da Mariana! -...! -...! -Quer a verdade? -Eu estou com medo! -Medo do que vai ser dessa menina se eu der a costas pra ela. -E o que você acha? -Se eu delatar esta mulher, a Mariana vai direto pra um abrigo, um orfanato não é? -Isto se a policia fizer alguma coisa! -Eu não sei como essas coisas funcionam, nunca lidei com isso! -...! -Eu estou ciente, eu não sei o que se passa na casa dessa mulher, por isto eu estou te ligando! -...! -Adoção?! -É, eu já andei pensando nisto! -Mas quanto tempo isto vai levar? -Pois é Cezar, eu não tenho nenhuma garantia de que eu vou conseguir adota-la. -...! -...! -Certo, verifica isso pra mim tá! -Me desculpa por estar te enchendo de trabalho, eu sei que você esta cheio de coisas pra fazer... -...! -É, é muito importante isso pra mim! -Tá, Obrigada, Tchau! Teresa desligava o telefone, mais aflita do que antes, Laura entrava devagar na sala fazendo uns ruídos para que Teresa perceba sua presença.
-Ah, Laura. Você estava ai?
-Acabei de fazer a danadinha dormir, acredita que ela acordou bem na hora que eu coloquei ela na cama? -Cantei uma musica e contei uma daquelas historinhas pra ela pegar no sono... -Agora está dormindo feito um anjinho! -A senhora quer um...?
-Eu estava falando com o Cézar no telefone.
-E ele está bem? -Quer dizer, as coisas lá em São Paulo estão bem?
Teresa conseguia sorrir de Laura e de suas tentativas de esconder a verdade.
-Esta tudo bem sim! -Laura, deixa eu te fazer uma pergunta? -Se você tivesse condições financeiras, o que você faria com tanto dinheiro?
Laura não escondia o nervosismo diante daquela pergunta, sua mente viajava longe com tantas possibilidades. Mas ela sabia do que se tratava a questão, sabia o que Teresa estava lhe perguntando.
-Ah, Dna.Teresa, sei lá... Primeiro eu ajudava toda minha família, meus amigos parentes...
-Você dividiria seu dinheiro com as pessoas que você ama, é isso?
Laura ficava cada vez mais perturbada. E sua resposta era cada vez menos concreta.
-É... Mais ou menos, eu acho!
Teresa se levantava do sofá, colocando a mão no ombro de Laura enquanto sorri.
-Não. Laura se espantava com aquele Não dito de supetão.
-Não, o que, Dna.Teresa?
-Você ia me oferecer um café. -A resposta é não. -Preciso dormir, amanhã quero estar bem para tomar uma decisão. -Sabe Laura, faz muito tempo que eu não sei o que é tomar uma decisão na minha vida. -E amanhã será o dia que vou tomar uma das decisões mais importantes da minha vida. -Boa noite meu bem! Laura respira aliviada. Amanhã será um dia importante e ela também precisa estar bem para saber tomar as decisões certas a fim de garantir o seu futuro.
...
As alegrias que Mariana trazia naquela manhã, Teresa queria que o dia nunca chegasse ao fim. Até a batida que a menina levou ao bater a cabeça na quina da mesa durante o almoço levou o coração de Teresa quase a parar de preocupação mas, por sorte uma enfermeira estava lá de plantão, Laura rapidamente agia acalmando o coração de Teresa que mais parecia o de uma mãe aflita sem qualquer necessidade por conta de um pequeno incidente... Já era de tardinha e com um peso no coração, Teresa já havia pedido para Laura preparar as malas de Mariana. Sozinha na sala com a menina Teresa encontrava forças para fazer uma nova pergunta a Mariana.
-Mari, vem cá meu anjo! Mariana pegava seu coelhinho rosa e ia até Teresa como se estivesse preparada para tomar uma bronca. Mas Teresa a acariciava no rosto e passava a mão em seus cabelos, sorrindo para a menina.
-Meu bem, preciso que você me diga uma coisa está bem? Mariana acenava sim com a cabeça meio timidamente.
-Você se lembra onde você mora? Mariana respondia que sim com a cabeça.
-Você se lembra do nome do lugar? Mariana novamente respondia em silencio que sim.
-Você pode falar pra mim meu amor? Mariana abaixava a cabeça e com certa tristeza, como se soubesse seu destino, falava para Teresa que recebia a resposta como um soco no estômago.